Todas as 22 modalidades das Paraolimpíadas são impressionantes, não só porque os atletas superam qualquer condição física a eles imposta, como também pela qualidade e nível técnico nos quais atuam.

Uma das modalidades que chama bastante a atenção é o Rugby de Cadeiras de Rodas, pelos impactos e pela dinâmica de jogo. O Rugby de Cadeira de Rodas nasceu na década de 1970, em Winnipeg, no Canadá, e foi desenvolvido por atletas tetraplégicos. Sua primeira inclusão nos jogos foi em Sydney-2000, que teve como vencedor da medalha de ouro os EUA. A modalidade é jogada com 4 jogadores de cada lado em uma quadra de 15 metros de largura por 28 metros de comprimento, muito semelhante às quadras de basquete. A bola utilizada lembra muito uma bola de vôlei e pode ser passada para qualquer direção, tocando o solo ou mesmo pelo ar.

O objetivo principal é passar a linha de gol adversária com duas rodas da cadeira e com total controle da bola, a área onde se marca o ponto é chamada de “área chave”. O jogo acontece em 4 períodos de 8 minutos, a princípio parece pouco, mas a exigência física é tremenda. Uma curiosidade interessante é que existe uma classificação funcional dos atletas. Os jogadores são categorizados em sete classes a depender do nível de severidade da lesão de cada um: 0,5; 1,0; 1,5; 2,0; 2,5; 3,0 e 3,5. As classes superiores são destinadas aos atletas que têm maiores níveis funcionais e as classes mais baixas são para jogadores de menor nível de funcionalidade. Por isso existe uma distinção entre cadeiras de ataque e cadeiras de defesa.  A cadeira de ataque tem um formato arredondado na frente, com o intuito de garantir a mobilidade desse jogador em quadra, pois são eles que têm o dever de conduzir a bola e marcar pontos, por isso é vital que esses jogadores não fiquem presos ou sejam bloqueados. Já a cadeira de defesa é utilizada por jogadores com classificação funcional baixa. Eles têm a responsabilidade de bloquear e abrir espaço na quadra para o condutor da bola. Dessa forma, a cadeira tem uma grade na frente que serve para bloquear e segurar jogadores da equipe adversária. Outro detalhe importante é que a soma da classificação dos jogadores não pode ultrapassar 8 pontos!

Entendendo as regras básicas você está pronto para ver um jogo: https://www.youtube.com/watch?v=GQ10TAbvofU

E para falar um pouco do Rugby de Cadeira de Rodas no Brasil não poderíamos deixar de conversar com o atleta de Vinhedo Luis Fernando Cavalli, também aluno do mestrado da UNICAMP e destaque no esporte da região, que apesar de não ter sido convocado para os Jogos por conta de uma lesão no quadril é e continua sendo um grande exemplo para a cidade. Ele nos recebeu em um treino do time de rugby da UNICAMP, segue a transcrição da entrevista.

CICERONE: Luis, como foi seu início nos esportes adaptados e desde quando você joga Rugby de Cadeira de Rodas?

LUIS: Bom, sofri um acidente de carro em 2004 e acabei lesionando a medula cervical. Sempre fui um aficionado por esporte e mesmo antes do acidente já praticava basquete, natação e corrida. Depois da lesão tomei contato com as modalidades adaptadas e paradesportivas. Joguei bastante handebol antes de começar a jogar Rugby. O Rugby jogo desde 2008 pela ADEACAMP (Associação de Esportes Adaptados de Campinas), que tem o Projeto de Extensão em Atividade Motora Adaptada da Faculdade de educação Física da UNICAMP.


CICERONE
: E o time da UNICAMP é um dos melhores? Como funcionam as competições nacionais?

LUIS: O time da UNICAMP tem uma ótima estrutura de treinos e vem mantendo uma boa equipe. Em Campinas ainda existe o GIGANTES, outro time da modalidade, que tem tido nos últimos anos resultados expressivos nos campeonatos nacionais. Em 2015 foi campeão de um das principais competições nacionais, o Campeonato Brasileiro de Rugby em Cadeira de Rodas. Outra equipe muito forte é a Minas Quad Rugby, campeã da mesma competição esse ano. Existem várias outras competições pelo Brasil, o calendário é bem cheio.

CICERONE: E as competições internacionais?

LUIS: Eu participo da seleção brasileira de rugby desde 2010, então tive a oportunidade de competir internacionalmente. Participei, por exemplo, dos jogos Para-Panamericanos de 2015. Mas existem outras competições como a Metro Cup, que reúne times de todo o mundo e para a qual o Brasil foi convidado em 2016.

CICERONE: E o que te fez entrar na modalidade de rugby de cadeira de rodas e o que você mais gosta?

LUIS: O mais interessante do Rugby de cadeira de rodas é a união dos jogadores e da equipe. Diferente de outras modalidades adaptadas o Rugby permite que cada jogadores independente do grau de lesão tenha sua função dentro do time. É um dos esportes paradesportivos com maior contato e exige muito de todos nós, então essa característica somada ao fato de ser um esporte coletivo faz com que o espírito de equipe seja importantíssimo. E é justamente isso que mais gosto.

CICERONE: E quais as principais dificuldades para os atletas?

LUIS: Devido ao grande numero de treinos e a rotina puxada às vezes nos machucamos com as cadeiras. Isso cria feridas na região da bacia que podem facilmente infeccionar se não forem cuidadas com atenção. O grande problema é que não sentimos os machucados e a recuperação deve incluir repouso, o que para um atleta é bem difícil, pois significa ficar fora de treinos, jogos e competições. Outra questão que sempre devemos ficar de olho é o controle de temperatura, os tetraplégicos por conta da lesão medular tem dificuldades no controle da temperatura corporal, o que pode gerar um grande mal estar, dificuldades de concentração e até desmaios. Por isso você viu durante o treino as paradas para água são bem rigorosas.

CICERONE: E na vida pessoal conta com apoio dos familiares?

LUIS: Minha esposa e meus filhos, tenho dois a Carolina e o Luis, me incentivam e me ajudam muito a seguir no caminho do paradesporto. Meus pais e meus irmãos também, sempre me deram o apoio e as condições necessárias para que eu pudesse trilhar esse caminho.

CICERONE: Você nasceu em Vinhedo? O que você acha da cidade?

LUIS: Na realidade nasci em São Paulo, mas moro em Vinhedo já há bastante tempo. É uma ótima cidade para se viver e foi uma ótima escolha para assegurar à minha família qualidade de vida e para os meus filhos crescerem. Gosto muito de Vinhedo!

A entrevista com o Luis foi feita antes da convocação para os Jogos Paraolímpicos do Rio de Janeiro, mas na época o atleta já nos havia avisado que as lesões no quadril poderiam ser um empecilho. De qualquer forma, o Luís esteve nas últimas pré-convocações da seleção e como falou na entrevista vem jogando desde 2010 no selecionado brasileiro. Pelo trabalho como atleta e como pesquisador de esportes adaptados parabenizamos ele por todos esforço e reiteramos que é um grande exemplo para todos nós. Agradecemos a entrevista e a recepção!

 

Texto: Thiago Tonus
Foto: Fotos de Joon Ho Kim

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